segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

Bahias

I

Na segunda te descobri
Sob a primeira santa cruz.
Te perdi no Mucuri
Reencontrei em Pau Brasil
Entre patos e pataxós,
Prima mata e primos bichos.
De mãos dadas te levo rumo a Minas,
Desviei para o frio do planalto
Te carregando sobre a tropa.
Abrimos vilas e cidades,
Sob árvores plantamos cacau,
Colhemos frutos, papamos jacas,
Carinhanha nos picou sobre amêndoas.
Subimos ao norte, caímos na primeira.

II

A primeira veio depois da segunda:
Terra do salvador,
Negra vestida de branco,
Turbante colorido.
Te levei aos trezentos altares,
Aprendi e ensinei outros sotaques,
Ofusquei o farol com o brilho
Das lentes dos teus olhos claros.
Da de cima vi a de baixo,
Forte e mercado de negros,
Púlpito de templo e tronco de escravos;
Água verde aprisionada
Por recôncavo festivo,
Praias recortadas por edifícios.
Te carreguei, minha loura,
Pelos braços e pernas,
Entre chaminés de pó negro
E peles pretas de fuligem e Áfricas.
Saí da primeira, suas ilhas,
Tambores, turistas e comidas.

III

A terceira foi a terceira visita,
Calor no quengo, calor nos abraços,
Falar de outras gentes
Tão próximas e diferentes da primeira.
Cocada de maracujá
Vira rapadura de laranja;
Abará é tapioca,
Abóbora é jerimum,
Mãinha é mãe e mamãe.
Ainda recende a bosta de cavalos
As pedras seculares das ruas,
Possível se ver umbu no pé
E não nas latas enferrujadas da feira;
Padre, juiz e delegado
São deus, autoridade e temor.
A terceira, em sua secura,
Traz a pureza e as dores de antanho.

IV

A quarta, onde te deixei,
É de lá e quase lá,
Tão longe de lá está.
Não parece com a mãe,
Não tem pai.
A quarta o Chico corta
Com suas águas vermelhas,
Vai de Juazeiro a Conquista,
Cria uvas e bodes.
Terra que tudo tem e nada dá
Para os rubros de barro e sol
E os brancos, olhos azuis,
De sul e soja, Pampa e Pará.
A quarta ainda não é,
Faz-se no arado.
Rasga-se nos papéis dos palácios,
Sai da baixeza da várzea
Ao pico da montanha.
A quarta é estranha,
É Bahia, Minas, Goiás
Ao redor do rio
E à sombra do nada.

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