domingo, 21 de junho de 2009

Fim de tarde fria



Fim de tarde
Fria no fog
Fundo da friagem,
Fareja meu gato
Fera disfarçada, quase frágil,
Bernardo, animal forte

Fez-se noite
Nas frestas dos versos forjados
Na fome da palavra
Sem frase

Calor em mim é febre
Por onde fujo
De nós dois
Frascos esvaziados
Flutuando nos lagos

Somos folhas secas
Nas fronhas de outono
E manjericão fresco
Vinho, queijos
Festas e fogueiras
Envoltos em fumaça
E fogos.

Artifícios da Bahia.


Beatriz M. Moura
Compulsão Diaria
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Look at me, Im as helpless as a kitten up a tree;
And I feel like Im clingin to a cloud,
I can t understand
I get misty, just holding your hand.
Walk my way,
And a thousand violins begin to play,
Or it might be the sound of your hello,
That music I hear,
I get misty, the moment youre near.
Cant you see that youre leading me on?
And its just what I want you to do,
Dont you notice how hopelessly Im lost
Thats why Im following you.
On my own,
When I wander through this wonderland alone,
Never knowing my right foot from my left
My hat from my glove
Im too misty, and too much in love.
Too misty,
And too much
In love.....


**
Misty tem melodia de Errol Garner e a letra é de Johnny Burke
Nota: Johnny Mathis tem esse tom de grande falsetto que me agrada e é bem anos 70. Quis assim, nada casual (há outras versões dessa canção bem mais casuais, sem essa pompa toda. Mas, hoje é sabado e eu cansei de T-Shirt, tenis e jeans)

Surpresa





A surpresa do dia,
Suspensa na delicadeza
Da bruma que prende
A pressa da manhã

Sabedoria da natureza
- Guardiã desse pedaço tenso -
Tempo entre o acordar
E o querer dormir
Há istante movediço
O segredo em desejo submerso
No movimento dos bichos






Imagem: Red Sails, por c_m_s_99



Colar de Carolina, Cecília Meireles

Com seu colar de coral,
Carolina
corre por entre as colunas
da colina.

O colar de Carolina
colore o colo de cal,
torna corada a menina.

E o sol, vendo aquela cor
do colar de Carolina,
pões coroas de coral

nas colunas da colina.


₢ Beatriz M. Moura
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Sinai(s)

A flor de cacto
Púrpura sobre espinho,
Aflora no deserto
Pétalas temporais
Em hora morna
Quando o sol cai

Ecos és-não-és
Empurram um homem
Fora de sua tenda de pele
Para cumprir seu rito
Dentro da própria túnica

Ele se dobra em promessas,
Ora sobre dunas
E mônadas crédulas
Onde sustenta sua fé
Retinta em pergaminhos

Submete mãos e pernas nômades
Ao final de mais um dia
Ifértil
Náufrago
Orfão sem oásis

Enquanto espalha sua raiva,
Engole vento e angústia

Depois desmaia
Nos seios de areia
E resta inerte
A ceu aberto

Imagem: Oracion en las dunas
Upload feito originalmente por
pixinalasidra

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Filhos
A meu filho Marcos


Daqui escutei
quando eles
chegaram rindo
e correndo
entraram
na sala
e logo
invadiram também
o escritório
(onde eu trabalhava)
num alvoroço
e rindo e correndo
se foram
com sua alegria
se foram
Só então
me perguntei
por que
não lhes dera
maior
atenção
se há tantos
e tantos
anos
não os via crianças
já que
agora
estão os três
com mais
de trinta anos.




Antes do Nome, Adélia Prado


Não me importa a palavra, esta corriqueira.

Quero é o esplêndido caos de onde emerge a sintaxe,

os sítios escuros onde nasce o “de”, o “aliás”,

o “o”, o “porém” e o “que”, esta incompreensível

muleta que me apóia.

Quem entender a linguagem entende Deus

cujo Filho é Verbo. Morre quem entender.

A palavra é disfarce de uma coisa mais grave, surda-muda,

foi inventada para ser calada.

Em momentos de graça, infreqüentíssimos,

se poderá apanhá-la: um peixe vivo com a mão.

Puro susto e terror.

Biblioteca

Na biblioteca - ninho e concha
Mofo e cheiro de livros,
Madeira arfando no espaço
Onde o que leio longe
Se relê na fibra do verso
Que incha som de silêncios
Depois murcha até ser
Feita temperança, por milagre
Um raro temperamento natural

Nem a pé nem voando
Percorro o impulso da palavra
Sigo a linha do verso
Cavo cada palmo até escoar o sal
Da linguagem onde nado calma
Bóio e sou a mim mesma revelada
Em casa, no cerne do poema
Com minha gata no colo
E poesia a contrapelo


₢ Beatriz M. Moura
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domingo, 14 de junho de 2009

Flora



A orquídea não resistiu,
Floresceu violeta.
Imitou o céu deste entardecer











₢ Beatriz M. Moura
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Ressaca




Meu olho corre*
Fato e foto
Nos grafos dessa luz
Que encantam meu afeto
Último ístmo
De onde parto e naufrago
No estribilho
- realismo é arte ultrapassada -
Sussurado por desconstrutivismos
Agarrados no costão
Lavado pela maré que vaza

À margem dessa trilha,
Vejo-me cindida,
Sargaço sem mar
Bóio em jogos,
Correntes gramaticais,
Coberta por nuvem
Carregada de signos,
significantes cinzas,
Sinais sem sujeito

Amanheço em solidão afásica,
Desnaturada, afundo
Versos e poemas na ponta dos remos
E a língua em aclive, gagueja
Se poesia é a liberdade
Da minha linguagem
Por que escrevo com medo de errar?

Erguem-se abrigos, casebres pós-modernos
Onde vivo solta à beira de abismos
Presa, por um fio, nas algas narrativas
Entrevistas como dejetos
E experimento prazer na falta de ar

Diante da perda de referenciais,
Afogo, no vórtice das calamidades,
Rima, ritmo, métrica, tema
E os leitores desamparados
Que me acusam.
Um diz ser o excluído
Do umbigo com que escrevo
Outra reclama ver prosa
Nas imagens - meu desejo de poema

Sem piedade, cometo heresias.
Quebro-me para ser capaz de andar
Sobre júbilo múltiplo
Pós - tudo, aguerrida
Tropeço em Barthes e Derrida,
Chuto Foucault
E adeus, Delleuze

Minha nostalgia - Âncora e brecha -,
Resgata-me. Nado pelo meio,
Atavesso a ressaca
De olho na palavra encarnada,
Falo em silêncio,
Agarro-me à letra,
Alcanço o porto sem cais
Minha única saída



Imagem: Foto de Marco Antonio Cavalcanti - publicada em O Globo Online
*Fui ler Água e Sal e voltei ardida pelo soneto e pela imagem,
culpa do Henrique que escreve tão bem.


₢ Beatriz M. Moura
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sábado, 6 de junho de 2009

Ama-me, nômade

Livre de laços
Sou estátua de limo
Em plena ilha no espaço
Deixo restos entre espinhos

Nesta insônia insólita
Insinuo-me entre juncos
Onde a luz é órbita do olho,
E o cheiro pergunta ao nariz

Se as paredes são lisas
Como carne e linho,
Para existir, repiso
-Sistere - ex -
Insisto nas entrelinhas





Volto raízes ao céu
E flutuo, em treva branca

Em mim, há um cosmo ínfimo,
Cidade quase caos aos trancos

Peço em silêncio, crestado ao relento
Úmido à beira-mar, mofada por um triz:
Ama-me a seco, íntimo, feito nômade do deserto

Depois, adormeco meu semblante
Feito morta, por horas, volto louca,
Outrem sob seu olhar, prometo brincar
Sem Sarte L'être nem Néant


Imagens:

₢ Beatriz M. Moura
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quinta-feira, 4 de junho de 2009

Poema Molhado

O raio divide o azul

Que se acinzenta num repente

Plúmbeo firmamento úmido

Que se desfaz

 

Os tambores de Poseidon

Ecoam em prédios e nuvens

Labirinto luminoso que desce

Driblando as gotas

 

Éolo esvazia os pulmões

Levantando saias e telhas

Arremessa o pássaro em novo rumo

Nada mais voa

 

Despenca e corre em rios

A sujeira do ar

Pinga líquida e lava o solo

Encharcado e feliz

 

©Marcos Pontes

terça-feira, 2 de junho de 2009

A Foice

Na sombra paralela

Ela caminha soturna

Lépida, silenciosa

E corta pronto

 

Aguardada

Desejada e alívio;

Surpresa,

Dor e lágrimas.

Não seleciona,

Como enxurrada

Arrasta a todos

Cedo ou mais cedo

 

Tudo se resume ao segundo

Ao instante final

Onde cessa a dor e o riso

O suor e a saliva

O sonho e a vida

Tudo para, mesmo os olhos

Só os pelos persistem

O que foi nada deixa

 

O cubículo e as cinzas

O suspiro e a quietude

O choro e as rezas

O tempo e o sempre

A presença e o nada

O depois incerto

O talvez do talvez